CUIABÁ
Search
Close this search box.

ENTREVISTA

Governo vai lançar plano para agilizar exploração de minerais estratégicos

Publicado em

 Ministério de Minas e Energia (MME) se prepara para lançar um plano nacional de minerais estratégicos, que deve focar na exploração de matéria-prima para fabricação de equipamentos para energia renovável e veículos elétricos e produção de fertilizantes.

“Vamos ter um plano de mineração estratégica, atacar todos os gargalos da mineração e colocar o maior empenho possível para termos uma mineração ágil”, disse Vitor Saback, secretário de Geologia e Mineração.

O secretário estima que hoje existam 70 mil licenças paradas, aguardando trâmites da Agência Nacional de Mineração (ANM), que atualmente sofre com a falta de recursos.

“Temos a possibilidade de vários outros mineradores que não fazem pedido, porque estão absolutamente descrentes que isso pode sair no curto prazo. Então, vamos fazer isso especialmente para transição energética e segurança alimentar”.

Medidas prioritárias

Segundo ele, todas as medidas do plano de mineração estratégico já estão formuladas e vão ser colocadas em uma esteira de produção. A primeira delas será a reestruturação da ANM que deve ocorrer até o final de agosto.

“A partir daí vir com uma série de atos do Poder Executivo, sejam atos de regulação, portarias ministeriais ou decretos do presidente da República que possam fomentar a atividade”, diz o secretário.

Além da ANM, Saback promete o fortalecimento do Serviço Geológico Brasileiro (SGB) – responsável pela pesquisa de reservas minerais no Brasil – e da própria Secretaria Nacional de Geologia, Mineração e Transformação.

“Precisamos acelerar os minerais para a transição energética. Tanto a pesquisa, quanto a extração, quanto o desenvolvimento da cadeia desses minerais”, pontua o secretário.

Atualmente, 27% do território continental brasileiro está mapeado na escala 1:100.000 (escala compatível para a primeira avaliação de potencial mineral de determinada área de interesse), segundo dados do SGB.

Outro ponto prioritário é a ampliação do financiamento para pesquisa e exploração de minerais.

“Precisamos ampliar o financiamento do setor mineral, especialmente desses minerais para transição energética. Temos instrumentos financeiros que, em breve, poderemos estar lançando mão”, afirmou o secretário.

Segurança energética e alimentar como eixos

Discutido desde o governo anterior, no Plano Nacional de Mineração 2050, a estratégia para minerais estratégicos deverá ter como foco a transição energética e a segurança alimentar.

Em março deste ano, o SGB lançou um relatório inédito em um evento de mineração no Canadá, com dados sobre ocorrências geológicas de minerais estratégicos no país.

Sendo lítio, cobre, grafita, níquel, urânio e terras raras, minerais essenciais para a transição energética, e fosfato e potássio, minerais destinados para a produção de fertilizantes – dos quais o Brasil é dependente de importações em cerca de 90%.

Segundo o relatório (.pdf, em inglês) da Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês), somente a demanda por lítio, por exemplo, deve crescer mais 40 vezes nas próximas duas décadas. Grafite, cobalto e níquel terão uma demanda entre 20 e 25 vezes maior, na comparação com o mercado atual.

Alguns minerais e seus usos na transição energética

  • Lítio, níquel, cobalto, manganês e grafite para fabricação de baterias
  • Elementos de terras raras para produção de turbinas eólicas e motores de veículos elétricos
  • Cobre, silício e prata usados em painéis fotovoltaicos
  • Cobre e alumínio para redes elétricas de transmissão 
Leia Também:  Consulta pública sobre áreas prioritárias para pesquisas de recursos minerais termina em 15 de junho

Fonte: IEA

“Temos o lítio do Jequitinhonha, o níquel, o cobre. Temos uma diversidade muito interessante que podemos colocar em produção e queremos que seja colocada em produção o mais rápido possível”, defende Saback.

Segundo o secretário, as estratégias de minerais críticos do Canadá e Austrália são as “grandes inspirações” para o plano brasileiro.

“É muito importante a gente se inspirar para não ficar aqui patinando, encontrando ações que, por vezes, não vão lograr o êxito que a gente espera”, explica.

Saback também defende que o Brasil aumente a participação da mineração no PIB, a exemplo dos dois países.

“Temos 3% a 4% do PIB do país do setor mineral. A Austrália, por exemplo, tem algo como 15% de PIB, o Canadá 9% de PIB. Então, do ponto de vista de geologia, temos condições tranquilamente de nos igualarmos a eles”.

Vale do Lítio

No caso do Lítio, Saback destaca a iniciativa, encabeçada pelo MME e o governo de Minas Gerais, para desenvolver a região do Vale do Jequitinhonha, apelidada de Vale do Lítio, por possuir grande parte da reserva do mineral no país.

“Temos ali todo um cinturão no Jequitinhonha, onde está sendo a produção, mas tem outras regiões ali que temos absoluta convicção que serão encontrados outros depósitos de classe mundial de lítio”.

Hoje a exploração do mineral na região é dominada pela empresa canadense Sigma Lithium. A companhia opera no Vale desde abril e realizou em julho o primeiro embarque do lítio mineiro rumo à China.

A empresa, que já investiu R$ 3 bilhões em Minas Gerais, espera fornecer, na primeira fase de operação, 270 mil toneladas de lítio verde por ano, o suficiente para abastecer 617 mil carros elétricos. A ideia é triplicar esse número já no ano que vem, chegando a 1,6 milhões de carros.

“Nós esperamos ter mais 30 ‘Sigmas’ para que se possa aproveitar esse boom de preços, de oportunidades, e ampliar globalmente a produção de lítio, que é importante para o mundo, mas é importante localmente também”, defende Saback.

Critérios ambientais e sociais

A exemplo do que ocorre no Vale do Lítio, onde a Sigma diz ser uma produção verde, com “zero carbono, zero rejeitos, zero químicos nocivos”, Saback garante que a expansão na exploração de minerais críticos deverá seguir critérios ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês).

“Queremos aprimorar dentro da mineração, uma mineração muito social, que se comunique bem com a comunidade onde ela está inserida, uma mineração responsável ambientalmente, sustentável e uma mineração absolutamente segura”.

A criação desses critérios deve acontecer via regulação, diz Saback, destacando que o descumprimento dessas regras pode inviabilizar a exploração.

“Não há de se permitir, por exemplo, que uma mineração para transição energética seja mais importante do que o impacto local. Então, se ela gerar um impacto local muito severo, muito agudo, não merece ser feita”.

Leia Também:  Governo criará conselho para coordenar políticas públicas na mineração, diz ministro

O secretário também destaca a importância de acompanhamento do impacto social, na geração de emprego e renda, desses futuros projetos de mineração.

“Mas é só mudar o PIB por mudar o PIB? Não. É incentivar o setor mineral para que a gente consiga gerar, por exemplo, mais 2,5 milhões de empregos. Hoje, a mineração já gera, entre empregos diretos e indiretos, 2,5 milhões de empregos”.

Industrialização gradual

Outra preocupação do plano desenvolvido pelo MME é o desenvolvimento de uma cadeia industrial associada à exploração dos minerais estratégicos.

“Temos tido reuniões aqui na Secretaria com atores norte-americanos, chineses, de Londres, enfim, vários que querem esse desenvolvimento da cadeia e topam fazer esse desenvolvimento aqui na região”, disse Saback.

Segundo ele, a industrialização seria de maneira gradual, primeiro focando no processamento químico desses minerais – que hoje está concentrado na China – e posteriormente o beneficiamento e uso na indústria de transformação, para fabricação de eletrônicos e equipamentos de geração renovável e baterias.

“Nós queremos que todas essas indústrias que se referem à transição energética caminhem, mas sem a pretensão dela já ir para a última etapa. Se nós pensarmos muito longe, lógico, é muito interessante, mas aí nós perdemos a oportunidade de desenvolver o mais rápido possível”.

Opep do Lítio e acordos bilaterais

Internacionalmente, os governos estão criando programas para diversificar e expandir as cadeias de fornecimento de minerais críticos. Isto inclui a Lei de Redução da Inflação dos Estados Unidos, a Lei de Matérias-Primas Críticas da União Europeia e Lei de Segurança Econômica do Japão.

Na América Latina, além do Brasil, Bolívia, ArgentinaChile e México se movimentam para deslanchar a exploração desses minerais, em especial o lítio.

O Triângulo do Lítio, formado por Bolívia, Argentina e Chile, concentra cerca de 65% das reservas mundiais do minério.

Até mesmo se cogitou uma parceria aos moldes da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) para o mineral, o que Saback não descarta.

“Temos que falar primeiro do objetivo para depois falar da forma. Por enquanto, estamos construindo objetivos em comum (…) O momento é de muita coesão entre os países aqui, da América Latina, a gente tem uma coesão muito grande”.

Para ele, o momento é mais propício a acordos bilaterais, como já existe com a Argentina na troca de informações sobre o lítio.

“Hoje, a gente está satisfeito com o modelo de cooperação bilateral. Agora, a depender do objetivo, pode ter uma outra forma (…) Acho que a oportunidade é muito grande. Queremos, sim, ter aqui na América Latina esse polo de desenvolvimento, um ajudando o outro, com uma cooperação mútua”.

O secretário também acredita que o Brasil não deve privilegiar algum país como potencial destino dos minerais.

“Nós somos um parceiro do mundo. Nós não temos ressalvas em relação a nenhum país, queremos ver as propostas do mundo em relação ao que nós temos. As possibilidades estão abertas em relação ao mundo inteiro”.

COMENTE ABAIXO:
Advertisement

Notícias

Como a China dominou minerais críticos da transição

Published

on

Tecnologias modernas têm como peças-chave 17 elementos da tabela periódica: as terras raras, essenciais para inteligência artificial, chips, bombas e produção de energia limpa. A China domina a produção, define preços e transforma esses metais em moeda geopolítica.

A mineração é apenas o primeiro passo. O maior desafio está no processamento, separação e refino dos elementos, que são caros e complexos.

A Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) estima que a China seja responsável por cerca de 61% da produção de terras raras e 92% do seu processamento. É justamente isso que confere ao país uma posição de força no tabuleiro da geopolítica.

As terras raras também são importantes para sistemas de defesa avançados, como fabricação de jatos militares, mísseis e sistemas de radar.

Isso garante à China um poder de barganha. Em resposta às tarifas impostas por Donald Trump, por exemplo, a China restringiu exportações de certos elementos, o que coloca as indústrias americanas de ponta em risco, como a de veículos elétricos o que coloca as indústrias americanas de ponta em risco, como a de veículos elétricos e a de defesa.

Não foi a primeira vez que terras raras entraram no centro de disputa dos EUA. Em 2022, Trump chegou a negociar com a Ucrânia a extração desses minerais em meio às conversas sobre um possível acordo de paz com a Rússia, ainda nos primeiros meses da guerra.

Hoje, países correm para diversificar suas fontes de suprimento e fortalecer suas próprias produções. “Mesmo antes do governo Trump, a Europa já havia acendido o alerta para os riscos da dependência externa de minerais estratégicos”, diz Júlio Nery, diretor de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).

Leia Também:  Empresa mato-grossense participa de mesa redonda sobre rastreabilidade promovido pela Câmara Federal

A ascensão chinesa

A China reconheceu o valor estratégico das terras raras nos anos 1960, quando os Estados Unidos ainda dominavam o mercado. Desde então, começou a copiar o modelo americano e comprou empresas estrangeiras – inclusive a maior empresa americana de ímãs de terras raras, a Magnequench.

Isso permitiu que a China tivesse em mãos as patentes, equipamentos e expertise técnica.  Nos anos 1990, o então líder chinês Deng Xiaoping (1904-1997), fez uma declaração que ficou famosa: “O Oriente Médio tem petróleo, a China tem terras raras.”

O investimento nesses minerais tornou-se uma estratégia de Estado. O país buscou consolidar a indústria, reduzindo-a para seis grandes empresas, em uma campanha chamada de “guerra secreta” contra a produção ilegal.

Também foram feitos investimentos em mapeamento geológico, a primeira etapa para o desenvolvimento da mineração, diz Guilherme Sonntag Hoerlle, geólogo e professor da Universidade Federal do Paraná.

“Há mais de 25 anos, a China investiu pesado em pesquisas nesses depósitos. Não porque tivesse reservas muito maiores, mas porque o governo chinês enxergou o potencial de longo prazo e manteve consistência”, diz.

Hoje, a China também tem consolidadas indústrias de carros elétricos, turbinas eólicas e robótica, que criam demanda interna significativa para terras raras e contribuem para gerar mais valor na cadeira.

Descaso ambiental

Esses avanços foram possíveis, em grande parte, porque a China operou sob quase nenhuma regra ambiental.

O processo de lixiviação (método químico usado para separar minerais), por exemplo, é feito em pilhas – o minério é empilhado e a solução química escoa dissolvendo os elementos; ou in situ, quando a reação é injetada diretamente no corpo mineral no próprio local.

Leia Também:  Empresa americana lança nave para explorar minerais no espaço e tentar fazer fortunas na Terra

As soluções usam ácidos fortes, como sulfúrico, nítrico ou clorídrico, que podem se infiltrar no solo e contaminar água e ar. O processo também exige grandes volumes de água e gera resíduos sólidos que, se não forem tratados, se acumulam como passivo ambiental. Um dos casos mais emblemáticos é o lago de rejeitos tóxicos em Baotou, na Mongólia Interior.

A separação e o refino de terras raras usam mais energia que a mineração inicial. A estimativa é entre 9 e 13 vezes a mais para cada tonelada processada.

Agora, países como Japão, Austrália, Canadá e Arábia Saudita vêm estabelecendo limites em suas políticas de minerais críticos, para não depender só da China, segundo Nery, do Ibram. Nesse cenário, o Brasil teria uma “janela de oportunidade” comercial.

“Se criar as condições necessárias, [o Brasil] pode avançar na cadeia de valor e estimular a industrialização local”, diz.

O domínio chinês gera incertezas para investimentos em novas minas e refinarias em outros países. A imprevisibilidade do mercado e a manipulação de preços tornam esses projetos arriscados e afastam capital de companhias no ocidente.

As descobertas de minerais e os processos de extração são de alto risco e investimento. No caso do Brasil, apenas uma mina extrai e exporta – para a China – um produto mais “puro” de terras raras, sem a separação de cada elemento.

COMENTE ABAIXO:
Continue Reading

MAIS LIDAS DA SEMANA