CUIABÁ
Search
Close this search box.

Artigos

O maior comprador de ouro do mundo mudou de estratégia pela primeira vez e fez despencar o preço do metal precioso mais desejado do planeta

Publicado em

*Por Flávia Marinho

 

O preço do ouro despencou na bolsa de valores! Pela primeira vez em 18 meses, o Banco Central da China não adquiriu ouro em maio, o que impactou negativamente no preço do metal precioso, que caiu 2,7%, atingindo aproximadamente US$ 2.311 por onça.

Desde novembro de 2022, a China vinha acumulando reservas, superando outros bancos centrais, como o da Índia, tornando-se o maior comprador de ouro do mundo.

Aquisições chinesas atingiram recordes durante o primeiro trimestre do ano, com total acumulado de 2.063 toneladas

“Minha impressão inicial é que a China, um importante impulsionador da alta do ouro no ano passado, não terminou de comprar ouro”, afirmou Ole Hansen, chefe de Estratégia de Commodities no Saxo Bank. Segundo Hansen, a pausa indica uma resistência em pagar preços recordes.

De acordo com o Conselho Mundial do Ouro, as aquisições chinesas atingiram recordes durante o primeiro trimestre do ano. E, no final de maio, o total acumulado era de 72,80 milhões de onças troy (2.063 toneladas).

Para Nicholas Frappell, chefe global de Mercados Institucionais na ABC Refinery, a reação inicial dos preços “parece um pouco técnica”. “Seria surpreendente que o anúncio representasse mais do que uma pausa na tendência geral da demanda atual do setor oficial”, acrescentou.

Embora no quinto mês do ano não tenha havido mudanças no balanço de ouro da China, a demanda recente foi impulsionada pela necessidade do país de diversificar suas reservas e se proteger contra a desvalorização de sua moeda.

Por que a China aumentou a reserva em ouro e o que isso tem a ver com juros nos EUA?

Há duas razões principais: a crescente preocupação com os juros e a dívida dos EUA, que já atingiu US$ 34 trilhões, além do risco de sanções econômicas devido às incertezas geopolíticas. Essa é a análise de Gilberto Cardoso, CEO da Tarraco Commodities e membro do Fórum Brasil Export.

“A China está apreensiva com o nível da dívida americana. Então, ela adota uma estratégia dupla: aumenta suas reservas de ouro físico e vende títulos do Tesouro dos EUA. Ela busca um ativo físico que oferece proteção contra a inflação e, ao mesmo tempo, reduz sua exposição aos títulos da dívida americana. A dívida e os juros americanos entraram em uma espiral perigosa e a China quer se proteger. É uma questão de diversificação de riscos”, explica.

Leia Também:  Prescrição nos processos de compensação financeira pela exploração mineral

Além disso, Cardoso destaca que os chineses temem novas sanções econômicas que possam prejudicar seu crescimento. “A China enfrenta o risco de sanções econômicas. O dólar se tornou uma arma americana, um instrumento financeiro, e isso preocupa a China. Todos os países do BRICs estão tentando reduzir sua dependência do dólar”, acrescenta.

Há também uma razão mais simples para a diversificação. “A China é um dos países que mais investe em dólares. É natural que busque diversificar em outras moedas, incluindo sua própria, o Yuan. Investir em ouro é uma escolha natural para um país tão exposto ao dólar. Nunca é prudente colocar todos os ovos na mesma cesta. A diversificação é essencial ao investir”, afirma Paulo Roberto Feldmann, professor de pós-graduação em economia internacional na Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).

Segundo Feldmann, o ouro tende a se valorizar durante crises econômicas. “Por outro lado, o valor do ouro pode cair abruptamente. A longo prazo, não é um investimento tão seguro. Portanto, investir em ouro é delicado. É necessário escolher bem o momento e estar seguro de que haverá uma crise que desvalorize as moedas e o petróleo, fazendo com que as pessoas busquem refúgio no ouro. Mas isso é raro. Não recomendaria investir em ouro, pois é preciso estar muito atento ao que pode acontecer a curto prazo”, conclui.

Não é só a China…

Rússia e EUA também mantêm uma grande parte de suas reservas em ouro. Por ser um ativo seguro e politicamente neutro, ele oferece proteção contra a inflação, sanções e até apreensões, conforme apontou Gita Gopinath, diretora adjunta do FMI, durante um evento em Stanford.

“A porcentagem de ouro nas reservas cambiais do bloco chinês tem aumentado desde 2015 – uma tendência que não é exclusiva da China e da Rússia. É importante notar que, durante o mesmo período, a participação do ouro nas reservas cambiais dos países do bloco dos EUA permaneceu globalmente estável”, explica Gopinath.

Leia Também:  Mineração é setor essencial na transição energética

A tendência entre os bancos centrais, segundo um estudo do FMI, indica que a compra de ouro é motivada por preocupações com o risco de sanções econômicas. “Os gestores de reservas cambiais tendem a aumentar suas participações em ouro para se proteger contra a incerteza econômica e geopolítica, incluindo o risco de sanções.”

… e o futuro?

Para Cardoso, há outra motivação no horizonte chinês para o aumento das reservas de ouro. Ele sugere olhar para o passado para entender o futuro. O Acordo de Bretton Woods, firmado em 1944 entre os países vencedores da Segunda Guerra Mundial, estabeleceu regras para o sistema monetário internacional. Uma dessas regras foi a proibição de lastrear a moeda em ouro, suspensa em 1971 pelo presidente dos EUA, Richard Nixon. O que isso tem a ver com a China agora?

“No futuro, a China planeja ter uma moeda digital lastreada em ouro. Isso é um retorno ao período anterior ao pós-guerra. Ela teme que a base monetária americana perca o controle devido ao endividamento, resultando em uma inflação global sem precedentes. Como deseja manter o controle de sua moeda e desindexá-la do dólar, a China compõe suas reservas com ouro físico. Ela compra ouro no mercado internacional e armazena. É uma reserva de valor que não se perde com o tempo”, observa Cardoso.

 

Flavia Marinho é Engenheira de Produção pós-graduada em Engenharia Elétrica e Automação, com vasta experiência na indústria de construção naval onshore e offshore. Nos últimos anos, tem se dedicado a escrever artigos para sites de notícias nas áreas da indústria, petróleo e gás, energia, construção naval, geopolítica, empregos e cursos, com mais de 7 mil artigos publicados. Sua expertise técnica e habilidade de comunicação a tornam uma referência respeitada em seu campo.*

COMENTE ABAIXO:
Advertisement

Artigos

O Brasil precisa assumir seu papel na corrida dos minerais críticos

Published

on

O Brasil está diante de uma oportunidade histórica. Com vastas reservas de lítio, nióbio, grafita, terras raras e outros minerais estratégicos, o país tem condições de se tornar protagonista da transição global para a energia limpa e a economia digital. Mas, para isso, é preciso abandonar improvisos e avançar em direção a uma política pública sólida e confiável.

O recente leilão da Agência Nacional de Mineração (ANM), no qual uma empresa recém-criada em Minas Gerais arrematou áreas de exploração maiores que o Distrito Federal, expôs de forma contundente a fragilidade do atual modelo. Ao permitir que agentes sem histórico ou capacidade financeira assumam concessões dessa magnitude, o Estado transmite o pior sinal possível: afasta investidores sérios e transforma recursos estratégicos em ativos especulativos.

Minerais críticos não são commodities comuns. Eles são a espinha dorsal da economia verde e digital, presentes em baterias, semicondutores, turbinas eólicas, telecomunicações e aplicações de defesa. Quem dominar sua produção, processamento e integração industrial terá papel decisivo na geopolítica do século XXI. Por isso, não se trata apenas de explorar reservas, mas de integrá-las a uma política industrial e tecnológica nacional.

Outros países compreenderam isso e já se moveram. A Turquia transformou suas reservas de boro em instrumento de influência industrial e diplomática, equilibrando cooperação entre Ocidente e China. A Índia lançou em 2025 a sua “National Critical Minerals Mission”, centralizando estratégia, conferindo ao governo federal autoridade exclusiva sobre os leilões e prevendo mais de mil projetos de exploração até 2031. O Canadá, por sua vez, vinculou sua política de minerais críticos diretamente à agenda climática e industrial, incentivando o refino doméstico e a agregação de valor local.

Leia Também:  A mineração brasileira e a Agenda ESG

O Brasil não parte do zero. Em 2024, o IBRAM lançou o “Green Paper”: Fundamentos e Diretrizes para a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos (PNMCE), propondo eixos estruturantes como definição clara da lista de minerais prioritários, integração com a transição energética, governança democrática, agregação de valor local, circularidade e inovação. Esse documento já oferece um caminho consistente para estruturar uma política de Estado.

Mais recentemente, o próprio governo federal reconheceu a urgência do tema. O Ministério de Minas e Energia anunciou que a Política Nacional de Minerais Críticos será lançada ainda em 2025. Na Câmara dos Deputados, tramita o PL 2780/2024, que institui a PNMCE e cuja aprovação é esperada antes da COP30, em novembro. A ANM também criou um departamento dedicado exclusivamente a minerais críticos e estratégicos, fortalecendo a institucionalidade do tema.

Além disso, foi lançado, em conjunto com o setor privado, um novo Green Paper sobre minerais críticos e a COP30, reforçando o papel do Brasil na diplomacia global desses recursos. Estas iniciativas apontam para um alinhamento promissor entre Executivo, Legislativo e setor privado. Mas para que se traduzam em confiança e atração de investimentos, é indispensável que o país estabeleça regras claras de pré-qualificação, exigindo capacidade técnica e financeira robusta de qualquer empresa interessada em concessões. Não podemos permitir que aventureiros se apossem de ativos vitais à transição energética e à reindustrialização.

Leia Também:  Governo de Minas prevê investimentos R$ 25-30 bilhões em projetos de lítio até 2030

Se quisermos protagonismo, concessões devem ser condicionadas a compromissos de investimento real, processamento local e integração às cadeias produtivas nacionais. Mais que extrair, é preciso refinar, industrializar e inovar no Brasil.

A corrida global pelos minerais críticos não é apenas sobre geologia – é sobre visão, credibilidade e soberania. O Brasil tem os recursos, as propostas e as instituições necessárias para se tornar referência mundial. Agora falta transformar boas intenções em política pública efetiva e duradoura. A hora de agir é agora.

JEAN PAUL PRATES

*Mestre em Política Energética e Gestão Ambiental pela Universidade da Pensilvânia e Mestre em Economia da Energia pelo IFP School (Paris). Foi presidente da Petrobras (2023–2024) e senador da República (2019–2023)

COMENTE ABAIXO:
Continue Reading

MAIS LIDAS DA SEMANA