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Oito passos para o minerador, um salto de credibilidade para toda a mineração

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A Resolução ANM nº 129/2023 estabelece deveres de prevenção à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa (PLD/FTP) para o setor de mineração e trouxe consideráveis desafios para os mineradores de pedras e metais preciosos. Os desafios são tantos que a recém-publicada Resolução ANM nº 138/2023, alterou alguns prazos de adequação e até deu um fôlego para os mineradores (pessoas físicas ou jurídicas) considerados de médio ou grande porte.

Todavia, o prazo de até 01.01.2024 não está muito distante e refere-se exclusivamente aos artigos 16 e 17.

Podemos afirmar que esta Resolução é um importante marco regulatório para o setor de mineração de pedras e metais preciosos no Brasil introduzindo uma série de requisitos e deveres de PLD/FTP para este segmento.

No mundo moderno dos negócios, a busca pelo lucro deve sempre vir acompanhada de visão de longo prazo pautada em princípios inabaláveis como o fiel cumprimento às leis, a adoção de melhores práticas efetivas, a sustentabilidade, a equidade de tratamento de colaboradores e contrapartes, a transparência e, compilando tudo isso, a integridade. A conta sempre chega – e com um alto custo – para aqueles que negligenciam o cumprimento regulatório ou adoção de melhores práticas, bem como para os que adotam o Compliance e seus temas correlatos – ESG, somente para citar um – como um mecanismo meramente oportunista e “vendem” aquilo que parecem ter – “o compliance de papel” – ou, em alguns casos, que até possuem, mas não acreditam efetivamente em sua real importância. Tem só porque tem que ter. O famoso “estar compliance”.

No entanto, como toda nova legislação ou tendência de mercado, os desafios são complexos, porém, junto a estes, surgem também ótimas oportunidades e, normalmente, quem larga na frente, leva vantagem competitiva.

Para as empresas de mineração que buscam “ser compliance” como algo estratégico, genuíno e buscam inseri-lo como parte de sua cultura corporativa e sua essência (o tal “fit cultural”), o resultado não será uma multa impagável ou noites sem dormir devido a notícias ou boatos na mídia. Em vez disso, colherão lucros sustentáveis, credibilidade e durabilidade nos negócios.

E para isso, há receita.

8 passos de PLD/FTP para realizar negócios mais saudáveis na mineração de metais e pedras preciosas:

  1. Conheça sempre seu cliente: a Resolução exige que as empresas de mineração de pedras e metais preciosos realizem uma completa identificação e cadastro de seus clientes, incluindo informações sobre a origem dos recursos financeiros utilizados nas transações.

E, conhecer o cliente é muito diferente de somente cadastrá-lo. Adotar medidas sólidas de diligência detalhada para efetivamente conhecer quem adquire o material do minerador (um PCO ou uma DTVM, por exemplo) é uma medida básica e vital para quem quer realizar bons negócios e sem dor de cabeça. Naturalmente, as medidas de diligência devem ser adotadas para conhecer todas as contrapartes relevantes como fornecedores e prestadores de serviço, funcionários, cooperados etc.

  1. Treinar e conscientizar: A Resolução estabelece que as empresas deste setor forneçam treinamento adequado tanto para seus funcionários quanto para as partes interessadas. O objetivo principal é o de elevar a conscientização em relação às questões de PLD/FTP e garantir a conformidade com as regulamentações aplicáveis.
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Os métodos de treinamento podem incluir tanto sessões presenciais quanto remotas, sempre conduzidas por profissionais experientes e com notório saber. Além disso, recomenda-se a distribuição de cartilhas educativas e a realização de testes periódicos de conhecimento. Essas abordagens representam excelentes ferramentas para promover a cultura de conformidade e contribuem significativamente para a robustez e aprimoramento do sistema interno de controle em relação a PLD/FTP

  1. Políticas e Procedimentos Internos: As empresas devem desenvolver e implementar políticas internas eficazes de PLD/FTP, bem como procedimentos de avaliação de risco. Isso permite a identificação e o eficaz gerenciamento de riscos associados às transações e/ou partes suspeitas.

Mas o papel aceita tudo, portanto, estas políticas e diretrizes não devem ser uma cópia ou algo produzido às pressas “só para inglês ver”. Tais documentos devem ser elaborados buscando adequação à legislação aplicável, mas sempre considerando a complexidade e realidade dos negócios e, principalmente, não podem ficar no fundo de uma gaveta. Devem ser constantemente atualizados, adaptados, implementados, monitorados e divulgados.

  1. Monitoramento de Transações: sistemas de monitoramento de transações devem ser implementados para identificar padrões incomuns de atividades que possam indicar lavagem de dinheiro.

Há diversas soluções tecnológicas que podem auxiliar neste aspecto caso a decisão seja de não desenvolver algo internamente, até porque o foco principal deve ser a extração e venda de metais e pedras preciosas. Mas para que isso ocorra de forma responsável, é importante que as empresas possuam um piloto destes sistemas com notório saber e experiência no tema.

  1. Manter Registros: todos os mineradores devem manter registros detalhados de 100% das operações realizadas, incluindo informações sobre clientes, transações financeiras e documentos relacionados. Esses registros devem ser mantidos por um período mínimo de 5 (cinco) anos.

Os sistemas ou até mesmo registros manuais devem permitir uma trilha completa de auditoria, arquivamento seguro e organizado, parâmetros e processos seguros de prevenção a fraudes ou comprometimento destas informações para o bom monitoramento de lavagem de dinheiro e para apresentação de informações consistentes aos reguladores, por exemplo.

  1. Comunicação de Operações ou Pessoas Suspeitas: As empresas são obrigadas a comunicar prontamente, às autoridades competentes, quaisquer operações ou pessoas que possam ser consideradas suspeitas de lavagem de dinheiro ou crimes correlatos. A depender do caso, tal comunicação tem que ser realizada em até 24 horas. Para comunicar de forma estruturada e que contribua com os esforços nacionais de PLD/FTP, é fundamental que o processo interno esteja bem definido, que haja uma apreciação colegiada dos casos suspeitos e, o mais importante, que isso seja baseado em um sistema sólido de monitoramento de cadastros e transações para detecção de tudo aquilo que fuja do habitual ou razoável.
  2. Auditorias e revisões periódicas: a Resolução exige auditorias e revisões regulares para garantir a conformidade contínua com as regulamentações. Isso promove uma cultura permanente de conformidade, permite a correção de falhas ou desvios nos processos internos e fortifica a governança interna.
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Uma auditoria não é algo para se evitar, esta função é primordial para trazer credibilidade aos negócios e permitirá a melhoria de processos internos e até a identificação de boas oportunidades.

  1. Não basta falar, tem que evidenciar: As empresas de mineração de pedras e metais preciosos são obrigadas a relatar ao órgão regulador competente suas políticas, procedimentos e evidências de conformidade com a Resolução.

Nada é gerenciável sem relatórios gerenciais. A emissão periódica e contínua de relatórios de falhas, ajustes em políticas, comunicações realizadas, resumo de decisões relevantes quanto ao tema PLD/FTP, indicadores, dentre outros são vitais no que se refere a criar um histórico consistente e evidenciar todos os esforços adotados com relação às medidas de prevenção e combate aos crimes aqui tratados.

Por óbvio, estes 8 passos não são exaustivos, e têm como objetivo principal trazer proteção ao setor de mineração de pedras e metais preciosos contra o fluxo de recursos ilícitos na economia, promover a transparência nas negociações e garantir que as empresas de mineração cumpram suas obrigações legais no combate à lavagem de dinheiro e evitem multas substanciais que doem no bolso e outras sanções, inclusive para as pessoas físicas, podendo acarretar até em inabilitação para o exercício das atividades e penas de reclusão.

Parafraseando o saudoso e histórico astronauta, Neil Armstrong, atrevo-me a concluir que são pequenos passos para os mineradores, mas um gigantesco salto de credibilidade para todo o setor.

Em toda caminhada, seja ela longa ou curta, o primeiro passo, grande ou pequeno, precisa ser dado.

Vinicius Pinho é coautor do livro Compliance 360º: riscos, estratégias, conflitos e vaidades no mundo corporativo e especialista em compliance e prevenção à lavagem de dinheiro

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Redução das Áreas de Lavra Garimpeira pela Resolução ANM nº 208/2025: Um Retrocesso Inconstitucional que Ameaça a Sustentabilidade do Garimpo em Mato Grosso, publicada em uma sexta feira treze

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Por Pamela Cigerza Alegria, advogada especializada em Direito Minerário e Ambiental

 

Uma sexta-feira treze traz preocupações para o setor mineral brasileiro, gerando inseguranças, e uma sensação nada auspiciosa para a mineração de média e pequena escala.

A recente edição da Resolução nº 208/2025 pela Agência Nacional de Mineração (ANM) trouxe à tona uma grave preocupação jurídica e social: a drástica redução do limite de área para Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), que passa a limitar para 50 hectares globais por pessoa física ou firma individual, e de 1.000 hectares globais para cooperativas. A medida, embora apresentada como um mecanismo de “controle” e “eficiência regulatória”, configura, em minha opinião, um retrocesso normativo com fortes indícios de inconstitucionalidade.

O regime de PLG é regulamentado pela Lei nº 7.805/1989, que estabelece claramente os limites máximos de área. Ao restringir esses limites por meio de resolução, a ANM ultrapassa sua função regulamentar e invade competência legislativa, violando o princípio da legalidade estrita (art. 5º, II, da Constituição). Não se pode admitir que uma agência reguladora, ainda que com papel técnico relevante, edite norma infralegal para restringir direitos garantidos em lei. A Lei nº 7.805/1989, em seu art. 2º, define o limite máximo de 50 hectares para cada permissão de lavra garimpeira. A Resolução 208/2025, ao restringir esse limite estipulando de forma global para 50 hectares, inova o ordenamento jurídico de forma questionável. A ANM, como autarquia reguladora, possui competência para normatizar a execução da legislação mineral, mas não para alterar limites legais.

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Além disso, a ausência de consulta pública ampla, de diálogo com cooperativas e mineradores, e de qualquer estudo de impacto socioeconômico revela a falta de proporcionalidade da medida. Em Estados como Mato Grosso — onde a PLG é não só uma atividade econômica, mas também um instrumento de inclusão social — a nova regra ameaça a subsistência de milhares de famílias, principalmente nas regiões de Juína, Aripuanã, Nossa Senhora do Livramento, Peixoto de Azevedo e Poconé.

A redução de área dificulta a viabilidade econômica de operações garimpeiras legalizadas, compromete cooperativas estruturadas e pode incentivar o retorno à informalidade. Pequenos garimpos, que já operam com margens reduzidas, serão diretamente afetados, enquanto grandes estruturas podem se beneficiar da exclusão dos menores concorrentes.

Curiosamente, os impactos dessa resolução parecem afetar apenas os pequenos e médios agentes. Grandes estruturas empresariais, com capacidade técnica e financeira para migrar para regimes mais complexos de lavra, seguirão operando sem grandes restrições. Na prática, temos uma medida que favorece a concentração de atividade mineral, enfraquecendo a atuação das cooperativas e dos garimpeiros independentes. O que limita o exercício da profissão do garimpeiro conforme seu estatuto próprio.

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O caminho jurídico mais adequado, a meu ver, é o ajuizamento de ações coletivas por parte de associações representativas do setor, visando à suspensão dos dispositivos da Resolução nº 208/2025 que reduzam o limite de área. Também é urgente a abertura de um processo de revisão participativa na ANM, com o envolvimento de Estados mineradores, universidades, cooperativas e órgãos de fiscalização ambiental.

A mineração artesanal e de pequena escala no Brasil precisa de regulação, sim, mas nunca à custa da legalidade e da função social do direito. O que se espera de uma agência técnica como a ANM é a construção de normas justas, seguras e dialogadas — não medidas autoritárias que criam insegurança jurídica e institucional.

Pamela Cigerza Alegria

Advogada, especialista em Direito Minerário. Atua na defesa da mineração brasileira, incluindo cooperativas e pequenos, médios e grandes mineradores.

Sócia do Escritório Ferreira Alegria Advogados Associados.

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