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O Brasil precisa assumir seu papel na corrida dos minerais críticos

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O Brasil está diante de uma oportunidade histórica. Com vastas reservas de lítio, nióbio, grafita, terras raras e outros minerais estratégicos, o país tem condições de se tornar protagonista da transição global para a energia limpa e a economia digital. Mas, para isso, é preciso abandonar improvisos e avançar em direção a uma política pública sólida e confiável.

O recente leilão da Agência Nacional de Mineração (ANM), no qual uma empresa recém-criada em Minas Gerais arrematou áreas de exploração maiores que o Distrito Federal, expôs de forma contundente a fragilidade do atual modelo. Ao permitir que agentes sem histórico ou capacidade financeira assumam concessões dessa magnitude, o Estado transmite o pior sinal possível: afasta investidores sérios e transforma recursos estratégicos em ativos especulativos.

Minerais críticos não são commodities comuns. Eles são a espinha dorsal da economia verde e digital, presentes em baterias, semicondutores, turbinas eólicas, telecomunicações e aplicações de defesa. Quem dominar sua produção, processamento e integração industrial terá papel decisivo na geopolítica do século XXI. Por isso, não se trata apenas de explorar reservas, mas de integrá-las a uma política industrial e tecnológica nacional.

Outros países compreenderam isso e já se moveram. A Turquia transformou suas reservas de boro em instrumento de influência industrial e diplomática, equilibrando cooperação entre Ocidente e China. A Índia lançou em 2025 a sua “National Critical Minerals Mission”, centralizando estratégia, conferindo ao governo federal autoridade exclusiva sobre os leilões e prevendo mais de mil projetos de exploração até 2031. O Canadá, por sua vez, vinculou sua política de minerais críticos diretamente à agenda climática e industrial, incentivando o refino doméstico e a agregação de valor local.

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O Brasil não parte do zero. Em 2024, o IBRAM lançou o “Green Paper”: Fundamentos e Diretrizes para a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos (PNMCE), propondo eixos estruturantes como definição clara da lista de minerais prioritários, integração com a transição energética, governança democrática, agregação de valor local, circularidade e inovação. Esse documento já oferece um caminho consistente para estruturar uma política de Estado.

Mais recentemente, o próprio governo federal reconheceu a urgência do tema. O Ministério de Minas e Energia anunciou que a Política Nacional de Minerais Críticos será lançada ainda em 2025. Na Câmara dos Deputados, tramita o PL 2780/2024, que institui a PNMCE e cuja aprovação é esperada antes da COP30, em novembro. A ANM também criou um departamento dedicado exclusivamente a minerais críticos e estratégicos, fortalecendo a institucionalidade do tema.

Além disso, foi lançado, em conjunto com o setor privado, um novo Green Paper sobre minerais críticos e a COP30, reforçando o papel do Brasil na diplomacia global desses recursos. Estas iniciativas apontam para um alinhamento promissor entre Executivo, Legislativo e setor privado. Mas para que se traduzam em confiança e atração de investimentos, é indispensável que o país estabeleça regras claras de pré-qualificação, exigindo capacidade técnica e financeira robusta de qualquer empresa interessada em concessões. Não podemos permitir que aventureiros se apossem de ativos vitais à transição energética e à reindustrialização.

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Se quisermos protagonismo, concessões devem ser condicionadas a compromissos de investimento real, processamento local e integração às cadeias produtivas nacionais. Mais que extrair, é preciso refinar, industrializar e inovar no Brasil.

A corrida global pelos minerais críticos não é apenas sobre geologia – é sobre visão, credibilidade e soberania. O Brasil tem os recursos, as propostas e as instituições necessárias para se tornar referência mundial. Agora falta transformar boas intenções em política pública efetiva e duradoura. A hora de agir é agora.

JEAN PAUL PRATES

*Mestre em Política Energética e Gestão Ambiental pela Universidade da Pensilvânia e Mestre em Economia da Energia pelo IFP School (Paris). Foi presidente da Petrobras (2023–2024) e senador da República (2019–2023)

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Redução das Áreas de Lavra Garimpeira pela Resolução ANM nº 208/2025: Um Retrocesso Inconstitucional que Ameaça a Sustentabilidade do Garimpo em Mato Grosso, publicada em uma sexta feira treze

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Por Pamela Cigerza Alegria, advogada especializada em Direito Minerário e Ambiental

 

Uma sexta-feira treze traz preocupações para o setor mineral brasileiro, gerando inseguranças, e uma sensação nada auspiciosa para a mineração de média e pequena escala.

A recente edição da Resolução nº 208/2025 pela Agência Nacional de Mineração (ANM) trouxe à tona uma grave preocupação jurídica e social: a drástica redução do limite de área para Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), que passa a limitar para 50 hectares globais por pessoa física ou firma individual, e de 1.000 hectares globais para cooperativas. A medida, embora apresentada como um mecanismo de “controle” e “eficiência regulatória”, configura, em minha opinião, um retrocesso normativo com fortes indícios de inconstitucionalidade.

O regime de PLG é regulamentado pela Lei nº 7.805/1989, que estabelece claramente os limites máximos de área. Ao restringir esses limites por meio de resolução, a ANM ultrapassa sua função regulamentar e invade competência legislativa, violando o princípio da legalidade estrita (art. 5º, II, da Constituição). Não se pode admitir que uma agência reguladora, ainda que com papel técnico relevante, edite norma infralegal para restringir direitos garantidos em lei. A Lei nº 7.805/1989, em seu art. 2º, define o limite máximo de 50 hectares para cada permissão de lavra garimpeira. A Resolução 208/2025, ao restringir esse limite estipulando de forma global para 50 hectares, inova o ordenamento jurídico de forma questionável. A ANM, como autarquia reguladora, possui competência para normatizar a execução da legislação mineral, mas não para alterar limites legais.

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Além disso, a ausência de consulta pública ampla, de diálogo com cooperativas e mineradores, e de qualquer estudo de impacto socioeconômico revela a falta de proporcionalidade da medida. Em Estados como Mato Grosso — onde a PLG é não só uma atividade econômica, mas também um instrumento de inclusão social — a nova regra ameaça a subsistência de milhares de famílias, principalmente nas regiões de Juína, Aripuanã, Nossa Senhora do Livramento, Peixoto de Azevedo e Poconé.

A redução de área dificulta a viabilidade econômica de operações garimpeiras legalizadas, compromete cooperativas estruturadas e pode incentivar o retorno à informalidade. Pequenos garimpos, que já operam com margens reduzidas, serão diretamente afetados, enquanto grandes estruturas podem se beneficiar da exclusão dos menores concorrentes.

Curiosamente, os impactos dessa resolução parecem afetar apenas os pequenos e médios agentes. Grandes estruturas empresariais, com capacidade técnica e financeira para migrar para regimes mais complexos de lavra, seguirão operando sem grandes restrições. Na prática, temos uma medida que favorece a concentração de atividade mineral, enfraquecendo a atuação das cooperativas e dos garimpeiros independentes. O que limita o exercício da profissão do garimpeiro conforme seu estatuto próprio.

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O caminho jurídico mais adequado, a meu ver, é o ajuizamento de ações coletivas por parte de associações representativas do setor, visando à suspensão dos dispositivos da Resolução nº 208/2025 que reduzam o limite de área. Também é urgente a abertura de um processo de revisão participativa na ANM, com o envolvimento de Estados mineradores, universidades, cooperativas e órgãos de fiscalização ambiental.

A mineração artesanal e de pequena escala no Brasil precisa de regulação, sim, mas nunca à custa da legalidade e da função social do direito. O que se espera de uma agência técnica como a ANM é a construção de normas justas, seguras e dialogadas — não medidas autoritárias que criam insegurança jurídica e institucional.

Pamela Cigerza Alegria

Advogada, especialista em Direito Minerário. Atua na defesa da mineração brasileira, incluindo cooperativas e pequenos, médios e grandes mineradores.

Sócia do Escritório Ferreira Alegria Advogados Associados.

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