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SUSTENTABILIDADE

Pesquisa estuda folha da Amazônia para substituição do mercúrio na extração de ouro

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Pesquisa realizada no Brasil mostrou que bioextratores obtidos a partir de folhas de pau-de-balsa (Ochroma pyramidale), árvore nativa da Amazônia, podem ser uma alternativa viável e sustentável para a extração de ouro em substituição ao mercúrio. Agora, uma nova etapa vai estudar quais formulações de bioextratores podem ser competitivas com o mercúrio tanto no processo de extração quanto na redução do impacto na saúde de trabalhadores e no meio ambiente. As folhas de pau-de-balsa já são usadas de forma artesanal na região de Chocó, na Colômbia, com essa finalidade.

Esse estudo será coordenado pela Embrapa Florestas (PR), em parceria com Embrapa Agrossilvipastoril (MT), Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Cooperativa dos Garimpeiros do Vale do Rio Peixoto (Coogavepe), Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“Nosso intuito é melhorar esse processo e produzir um bioextrator atóxico, competitivo com o mercúrio”, explica a pesquisadora da Embrapa Marina Morales, responsável pela condução dos estudos. “A ideia é sair da prática artesanal para escala em pequena mineração, com análises de toxicidade e citotoxicidade e práticas que facilitem o uso”, informa. Os resultados devem ser apresentados até o início de 2025.

Em uma etapa posterior, a pesquisa também vai trabalhar com o sistema de produção do pau-de-balsa, já que essa espécie florestal é uma alternativa para a recuperação de áreas degradadas nos próprios garimpos. Com isso, plantios poderiam ser feitos no mesmo local de produção do bioextrator, viabilizando uma biofábrica local. “Assim, além de fornecer matéria-prima – folhas –, as árvores do pau-de-balsa podem contribuir para a revegetação da área antropizada, dando condições para o estabelecimento de outras espécies florestais e possibilidade de exploração da madeira do pau-de-balsa no final do ciclo de crescimento”, declara o pesquisador da Embrapa Maurel Behling.

Segundo Gilson Camboim, presidente da Coogavepe, “a pesquisa traz boas expectativas para a atividade garimpeira, como a substituição do mercúrio por um produto sustentável e o barateamento do processo de extração, já que o elemento químico tem alto custo”. Para a ex-presidente da Coogavepe, Solange Luizão Barbuio Barbosa, que iniciou as discussões para participação no projeto, “o resultado pode ser pensado não só como uma simples produção de um bioextrator, pois ele abre outras vertentes para a utilização dessa planta, como o reflorestamento de áreas degradadas e a utilização da madeira, que podem beneficiar o proprietário de uma área lavrada”.

O estudo

A primeira fase da pesquisa, realizada em 2020, focou na caracterização química das folhas de pau-de-balsa. O estudo preliminar foi financiado pela designer de joias Raquel de Queiroz, inspirado na experiência de Chocó, na Colômbia, e objetivou entender as propriedades da folha. “Quando fiquei sabendo dessa possibilidade já em prática na Colômbia, imaginei que a ciência poderia nos ajudar a utilizar o pau-de-balsa de forma mais efetiva”, relata a designer. “Para nós, que atuamos nesse mercado, a melhoria de processos é importante e necessária. Isso contribui para melhorias na saúde e qualidade ambiental das pessoas e locais envolvidos no processo, além de garantir que nosso produto é produzido de acordo com práticas modernas e mais sustentáveis”, avalia.

Em 2023, se inicia uma nova etapa do estudo, que será realizado em parceria com um garimpo da região de Peixoto de Azevedo (MT). “Selecionamos um garimpo da Coogavepe, parceira do projeto para coleta de amostras e para a comparação da extração tradicional com mercúrio com o bioextrator”, explica Morales. No local, serão recolhidas amostras dos concentrados de minério aluvionar, ou seja, material com ouro concentrado que iria para o processo de separação com mercúrio.

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O engenheiro de minas Matheus Lopes, da Coogavepe, explica como ocorre o processo de extração de ouro de aluvião. “De forma simplificada, no processo de extração de ouro de aluvião, ou seja, em solo superficial, e não subterrâneo, após a remoção do solo por desmonte mecânico, jatos de água desagregam o minério – cascalho – e bombas-draga o transportam para caixas concentradoras com carpetes e grelhas, gerando o que chamamos de “concentrado”. Este vai para a central de amalgamação para inserção do mercúrio, etapa em que o ouro é finalmente extraído e separado dos demais minerais”, diz. No projeto, esse “concentrado” irá para os laboratórios para os testes dos bioextratores com pau-de-balsa. A primeira fase do projeto encontrou quatro possíveis formulações que serão testadas e comparadas.

 

Inserção de bioextratores

Essas formulações de bioextratores serão avaliadas quanto à eficiência em recuperar ouro em minério aluvionar. O bioextrator que apresentar melhor desempenho passará por ajustes com o objetivo de melhorar ainda mais a extração, e também será estudado o processo mecânico a ser utilizado na extração. A eficiência da extração será comparada ao processo tradicional por amalgamação com mercúrio. Além disso, serão realizadas análises de toxicidade e citotoxicidade (este último, com um indicador animal e um vegetal). “Além da nossa equipe de pesquisa e laboratório, o projeto também vai receber estudantes de graduação e pós-graduação para abrangermos diferentes linhas de pesquisa, possibilitando resultados mais completos”, explica a pesquisadora.

O mercúrio

Conhecidamente utilizado para separar o ouro da lama e demais resíduos do minério aluvionar, o mercúrio (Hg) é usado por garimpeiros artesanais e pela indústria mineral de pequena escala, diferentemente das mineradoras de grande porte que utilizam, comumente, o cianeto, que também pode gerar danos à saúde humana e ao meio ambiente. A amalgamação é um processo de junção das partículas de ouro ao mercúrio, formando uma liga metálica que, depois, é de fácil separação por aquecimento. O processo de separação, em garimpos legalizados, ocorre em centrais de amalgamação, de modo a reduzir a emissão de mercúrio para o meio ambiente. Já em extrações ilegais, esse processo ocorre a céu aberto, carregando o mercúrio por quilômetros.

Doença de Minamata

O mercúrio, ao ser inalado ou consumido, tem ação cumulativa no corpo humano e traz sérios riscos à saúde e ao ambiente. No ser humano, o acúmulo pode levar à síndrome neurodegenerativa, por envenenamento, chamada de doença de Minamata. Durante muitos anos, na década de 1950, no Japão, uma fábrica jogava seus dejetos na baía de Minamata, o que causou a contaminação de peixes, frutos do mar, gatos e seres humanos. Entre os sintomas, estão a dificuldade de coordenação das mãos e dos pés, distúrbios da fala e dificuldades de equilíbrio. A doença causou a morte de 2 mil pessoas e deixou outras milhares com sequelas. Diante disso, foi criada, em 2013, a Convenção de Minamata, da qual o Brasil se tornou signatário em 2017. Composta por 140 países, a Convenção de Minamata tem sua origem no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e visa reduzir as emissões e eliminar o uso de mercúrio, a fim de proteger a saúde humana e o meio ambiente.

O pau-de-balsa

Segundo o livro Espécies Arbóreas Brasileiras, de autoria do pesquisador emérito da Embrapa Florestas Paulo Ernani de Carvalho, o pau-de-balsa (Ochroma pyramidale) é uma espécie arbórea que não perde todas as folhas durante o ano. As árvores maiores atingem dimensões próximas a 30 metros de altura. Dentro do Brasil, recebe diversos nomes vulgares, como, no Acre, algodoeiro, algodoeiro bravo, algodão-bravo, paco-paco e pau-de-balsa; no Amazonas, pau-de-balsa e pau-de-jangada; e no Pará, balsa, pata-de-lebre, pau-de-balsa, pau-de-jangada e topa.

A madeira do pau-de-balsa é leve e resistente, normalmente utilizada para fazer artesanatos, brinquedos, aeromodelos, placas de interiores em construções, chapas revestidas com materiais sintéticos, material térmico em câmaras frias, na produção de compensados e na construção de hélices para geradores de energia eólicos.

A árvore de pau-de-balsa tem crescimento rápido e contribui para melhorar o desenvolvimento de florestas secundárias, podendo ser utilizada em restaurações florestais, como espécie pioneira, e em plantios comerciais de árvores com ciclos de colheita relativamente curtos comparados com outras espécies cultivadas. No caso da adoção das folhas de pau-de-balsa para a extração do ouro, a ideia é que ela esteja associada à utilização da espécie para a recuperação das áreas alteradas com a exploração dos minérios dos depósitos de aluvião (lavra a céu aberto).

No início da década passada, a Embrapa Agrossilvipastoril desenvolveu pesquisas sobre a silvicultura do pau-de-balsa. Experimentos realizados em Guarantã do Norte (MT), em parceria com a Prefeitura local, Cooperativa de Produtores de Pau de Balsa de Mato Grosso (Copromab) e Compensados São Francisco serviram para obtenção de recomendações de adubação e espaçamento para o plantio comercial da espécie.

Para que serve o ouro?

Além da fabricação de joias e como ativo financeiro, o ouro é usado em diversos produtos.  É, por exemplo, componente de  placas de computadores, telefones celulares, televisores e câmeras. Seu uso se dá também em tratamentos de saúde, terapias para o câncer, reumatismo, malária, tratamentos homeopáticos e dentários. Todos esses usos se devem às suas propriedades favoráveis à condutividade elétrica, resistência à corrosão e a boa combinação de propriedades físicas e químicas.

Garimpo versus extração ilegal

A atividade garimpeira é uma forma legal de extração das riquezas minerais (Lei 7.805/1989), desde que autorizada por uma Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), expedida pela Agência Nacional de Mineração (ANM). As maiores mineradoras são denominadas de “grande mineração” ou “mineradoras de grande porte”. Já a atividade garimpeira consiste nas atividades de mineração artesanal e de pequena escala (Mape), e enquadra as cooperativas de garimpeiros e os garimpeiros individuais.

Esses empreendimentos em regime de PLG foram responsáveis, em 2021, segundo a ANM, pela extração de 32,4 toneladas de ouro, o que representou 34,3% da produção total de ouro no Brasil e cerca de R$ 218 milhões em arrecadação para o País, referentes ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e à Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).

Para obter a PLG, os empreendimentos devem seguir alguns critérios exigidos pela ANM, como ter a licença ambiental expedida pelo órgão ambiental competente, não exceder a área em 50 hectares para requerente individual, e mil hectares, quando outorgada para a cooperativa de garimpeiros, podendo chegar a 10 mil hectares na Amazônia Legal; e não ser praticada em terras indígenas ou áreas protegidas. Já a extração mineral ilegal não atende a nenhuma dessas exigências, causando diversos impactos.

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Mineração se movimenta na COP e quer protagonismo na transição energética

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O setor mineral, de olho nas oportunidades que surgem na era da transição energética, enviou um time de peso para a COP30. O objetivo é reforçar a articulação com o governo, com representantes do setor ambiental e marcar território como protagonista na economia verde.

O diagnóstico é direto: não existe transição energética sem mineração.

Minerais, dos mais tradicionais — como ferro e ouro —, aos mais modernos, a exemplo de lítio, nióbio e terras raras, são insumos essenciais para a produção de tecnologias limpas, como baterias, turbinas eólicas e painéis solares.

Dados da IEA (Agência Internacional de Energia) apontam que a demanda por cobalto e elementos de terras raras deve crescer entre 50% e 60% até 2040, impulsionada pela transição energética.

Outro foco das empresas, que recentemente têm feito gestos de aproximação aos ambientalistas, é mostrar “a nova cara” da mineração, historicamente lembrada por seus impactos ambientais e por tragédias recentes.

Executivos afirmam que os avanços tecnológicos, a legislação mais rigorosa e os compromissos internacionais têm alinhado o setor às pautas sustentáveis.

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Apesar de ainda ser uma atividade poluente, argumentam que é insubstituível, assim como o petróleo.

Durante as duas semanas de evento, a estratégia é apresentar exemplos práticos de inovação, como o reaproveitamento de água em processos produtivos, e se aproximar de organizações ambientais, tradicionalmente críticas à atividade mineral.

Representantes de peso do setor, como o presidente da Vale, estarão no evento. A agenda comercial também é prioritária: estão previstos encontros de mineradoras com bancos tradicionais e de desenvolvimento, que têm lançado cada vez mais linhas de crédito voltadas ao setor.

Além disso, representantes do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração) devem se reunir com autoridades dos governos do Canadá e da Austrália, países que vêm intensificando investimentos no setor mineral brasileiro.

Autoridades e executivos enxergam a COP como uma oportunidade de posicionar o Brasil como ambiente favorável a novos investimentos, especialmente de potências europeias e norte-americanas, em um momento em que o mundo busca garantir acesso seguro a minerais críticos.

Um dos argumentos que será levado à mesa pelas autoridades brasileiras, especialmente em conversas com países ocidentais, é a dominância da China nesse setor.

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Reduzir o protagonismo de Pequim tem sido uma das prioridades da nova gestão de Donald Trump.

No final de outubro, o encarregado de Negócios dos Estados Unidos no Brasil, Gabriel Escobar, se reuniu com representantes da australiana St George Mining, gigante do setor de mineração, dona do Projeto Araxá, em Minas Gerais, que concentra uma das maiores reservas de terras raras da América do Sul.

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