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IBGM NO BRASIL

Os riscos decorrentes do garimpo ilegal de ouro para a cadeia de valor da indústria joalheira

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Por Ecio Morais*

 

O IBGM, na condição de órgão de representação da indústria e do varejo de joias no Brasil, observa com preocupação os desdobramentos das investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público acerca do garimpo ilegal de ouro na Amazônia. Entenda-se por garimpo ilegal a atividade predatória realizada em terras indígenas e/ou área de conservação ambiental, ou ainda em terras sem requerimento de permissão de lavra.

Como é sabido, por força das leis 7.766/89 e 12.844/13, o ouro extraído em garimpo tem natureza jurídica de ativo financeiro ou de instrumento cambial e somente pode ser adquirido por uma instituição financeira legalmente autorizada pelo Banco Central do Brasil, no caso as DTVMs. Ao vendedor do metal (garimpeiro / titular da Permissão de Lavra Garimpeira) cabe, no ato da venda, apresentar seus documentos pessoais e indicar o título da lavra correspondente ao ouro comercializado. De acordo com o art. 39 da lei 12.844/13, o vendedor é responsável pela veracidade das informações prestadas (princípio da boa-fé). Ao adquirente DTVM, cabe apenas exigir e arquivar a documentação.

As denúncias que recaem sobre as DTVMs referem-se a um suposto esquema de “lavagem do metal na primeira aquisição”. Ou seja, ocorre nas hipóteses em que o ouro extraído de uma área não autorizada (indígena ou de conservação), portanto sem licença ou Permissão de Lavra, é comercializado e internalizado no sistema com a informação de uma origem falsa (uma PLG existente e supostamente regular). A partir daí, o ouro segue seu curso “legal” sendo exportado, destinado ao mercado financeiro ou para uma indústria ou um varejo de joias.

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Um caso concreto onde, comprovadamente, se observe o esquema de “lavagem” ou “esquentamento” do metal, poderá ensejar a imputação de crimes de diversas naturezas: ambiental, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Caso se identifique um “conluio” entre garimpo, DTVMs, indústria e/ou varejo na prática criminosa, o processo penal/ambiental atingirá a todos.

Dito isso, passo a relatar o entendimento do Ministério Público Federal sobre o tema manifestado em documentos oficiais:

  1. A disseminação do garimpo ilegal de ouro é hoje uma das principais ameaças à integridade ecológica da Floresta Amazônica;
  2. Contribuem para a para a perpetração desses danos todos aqueles que, de algum modo, consomem ouro extraído ilegalmente, ou correm o risco de estar consumindo ouro extraído ilegalmente, por não contar com mecanismos de compliance suficientemente fortes a ponto de assegurar a origem lícita dos insumos (…);
  3. No caso do mercado de ouro, existe nexo de causalidade entre o dano gerado pela atividade de garimpo e a conduta manifestada por empresas que utilizam esse ouro em seus processos produtivos, ainda que o façam sem consciência de tal circunstância, já que irrelevantes o dolo ou culpa;
  4. O simples fato de adquirir-se ouro de Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários ou de indústrias terceirizadas de produção de joias, com emissão de notas fiscais, não demonstra a legalidade e origem ambientalmente regular do minério utilizado em processos produtivos do ente comprador.
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Diante desse posicionamento duro do Ministério Público, naturalmente que existe o contraponto da boa-fé contratual, o princípio da inocência e da ampla defesa consagrados na Constituição Federal de 1988. Entretanto, o objetivo do IBGM não é conjecturar sobre um hipotético caso concreto de um delito/processo de lavagem de capitais envolvendo o ouro. Mas sim de intenção é de alertar para a urgência de se formular um posicionamento conjunto do setor joalheiro e de seus fornecedores de insumos, visando promover mecanismos transparentes e eficazes de controle da origem do ouro, certificando-se da veracidade das informações recebidas e, ao “fim e ao cabo”, garantir a estrita observância aos direitos do consumidor final.

Trata-se de um projeto, de um esforço e de um compromisso conjunto do setor, envolvendo DTVMs, cooperativas de garimpeiros, mineração de gemas, indústrias e o varejo de joias. Por ora, cabe ao empresariado adotar a máxima atenção sobre suas operações para aquisição de ouro e gemas.

Informações adicionais ou esclarecimento de dúvidas sobre a legislação pertinente aos temas abordados no presente artigo, podem ser obtidas com o dept° jurídico do Instituto pelo e-mail [email protected]

 

*Ecio Morais é o diretor executivo do IBGM. Economista, mestre em economia e bacharelando em direito, sua experiência soma mais de 20 anos à frente de entidades de classe setoriais.

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O Brasil precisa assumir seu papel na corrida dos minerais críticos

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O Brasil está diante de uma oportunidade histórica. Com vastas reservas de lítio, nióbio, grafita, terras raras e outros minerais estratégicos, o país tem condições de se tornar protagonista da transição global para a energia limpa e a economia digital. Mas, para isso, é preciso abandonar improvisos e avançar em direção a uma política pública sólida e confiável.

O recente leilão da Agência Nacional de Mineração (ANM), no qual uma empresa recém-criada em Minas Gerais arrematou áreas de exploração maiores que o Distrito Federal, expôs de forma contundente a fragilidade do atual modelo. Ao permitir que agentes sem histórico ou capacidade financeira assumam concessões dessa magnitude, o Estado transmite o pior sinal possível: afasta investidores sérios e transforma recursos estratégicos em ativos especulativos.

Minerais críticos não são commodities comuns. Eles são a espinha dorsal da economia verde e digital, presentes em baterias, semicondutores, turbinas eólicas, telecomunicações e aplicações de defesa. Quem dominar sua produção, processamento e integração industrial terá papel decisivo na geopolítica do século XXI. Por isso, não se trata apenas de explorar reservas, mas de integrá-las a uma política industrial e tecnológica nacional.

Outros países compreenderam isso e já se moveram. A Turquia transformou suas reservas de boro em instrumento de influência industrial e diplomática, equilibrando cooperação entre Ocidente e China. A Índia lançou em 2025 a sua “National Critical Minerals Mission”, centralizando estratégia, conferindo ao governo federal autoridade exclusiva sobre os leilões e prevendo mais de mil projetos de exploração até 2031. O Canadá, por sua vez, vinculou sua política de minerais críticos diretamente à agenda climática e industrial, incentivando o refino doméstico e a agregação de valor local.

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O Brasil não parte do zero. Em 2024, o IBRAM lançou o “Green Paper”: Fundamentos e Diretrizes para a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos (PNMCE), propondo eixos estruturantes como definição clara da lista de minerais prioritários, integração com a transição energética, governança democrática, agregação de valor local, circularidade e inovação. Esse documento já oferece um caminho consistente para estruturar uma política de Estado.

Mais recentemente, o próprio governo federal reconheceu a urgência do tema. O Ministério de Minas e Energia anunciou que a Política Nacional de Minerais Críticos será lançada ainda em 2025. Na Câmara dos Deputados, tramita o PL 2780/2024, que institui a PNMCE e cuja aprovação é esperada antes da COP30, em novembro. A ANM também criou um departamento dedicado exclusivamente a minerais críticos e estratégicos, fortalecendo a institucionalidade do tema.

Além disso, foi lançado, em conjunto com o setor privado, um novo Green Paper sobre minerais críticos e a COP30, reforçando o papel do Brasil na diplomacia global desses recursos. Estas iniciativas apontam para um alinhamento promissor entre Executivo, Legislativo e setor privado. Mas para que se traduzam em confiança e atração de investimentos, é indispensável que o país estabeleça regras claras de pré-qualificação, exigindo capacidade técnica e financeira robusta de qualquer empresa interessada em concessões. Não podemos permitir que aventureiros se apossem de ativos vitais à transição energética e à reindustrialização.

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Se quisermos protagonismo, concessões devem ser condicionadas a compromissos de investimento real, processamento local e integração às cadeias produtivas nacionais. Mais que extrair, é preciso refinar, industrializar e inovar no Brasil.

A corrida global pelos minerais críticos não é apenas sobre geologia – é sobre visão, credibilidade e soberania. O Brasil tem os recursos, as propostas e as instituições necessárias para se tornar referência mundial. Agora falta transformar boas intenções em política pública efetiva e duradoura. A hora de agir é agora.

JEAN PAUL PRATES

*Mestre em Política Energética e Gestão Ambiental pela Universidade da Pensilvânia e Mestre em Economia da Energia pelo IFP School (Paris). Foi presidente da Petrobras (2023–2024) e senador da República (2019–2023)

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